CONSÓRCIO PÚBLICO
Texto: Valéria A.B.Salgado (dezembro/2019)
Consórcio público é um formato jurídico-institucional de atuação interfederativa do Poder Público, previsto no art. 241 da Constituição Federal e regulamentado pela Lei Federal nº 11.107, de 6 de abril de 2005, para favorecer e instrumentalizar a negociação, a articulação, a coordenação e a implementação cooperada de políticas públicas de responsabilidade compartilhada dos entes federados, de forma a possibilitar a otimização de recursos e de esforços na implementação de projetos e atividades de interesse comum.
Art. 241 da Constituição Federal:
A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de Lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.
Segundo dispõe a Justificativa que acompanhou o Projeto de Lei nº. 1.071, de 1999, convertido, posteriormente, na Lei nº 11.107, de 2005, a proposição de normas gerais sobre consórcios públicos, em regulamentação ao art. 241 da Constituição emendado pela EC19/1998, visou apresentar soluções para a ação cooperada entre entes federativos na implantação das políticas de saúde, meio ambiente, segurança, conservação de estradas, agriculturas e outras.
Entendidos como forma de racionalizar investimentos, recursos humanos e gastos de custeio através da elaboração de uma escala de produção de serviços, evitando duplicação e desperdício, os consórcios públicos melhoram substancialmente a capacidade resolutiva de seus participes.
A experiência é tão exitosa que já vem sendo adotada em dezesseis Estados brasileiros, além de ter sido incluída, pelo Ministério da Saúde, como proposta prioritária para organização microrregional dos atendimentos de média e alta complexidade. Destarte, para que haja uma uniformização normativa na implantação e no funcionamento dos consórcios, dirimindo dúvidas por vezes existentes entre os entes federados quando da formação de um consórcio, a presente proposição, mais do que oportuna é necessária para a expansão do programa de consórcios públicos. (Justificação do Projeto de Lei nº. 1077/1999, Diário da Câmara dos Deputados de 24 de agosto de 1999, pp. 36245-36246)
A Lei nº 11.107, de 2005, ao disciplinar a constituição de consórcios públicos, introduziu no ordenamento jurídico nacional a figura jurídica da associação pública, na qualidade de autarquia interfederativa; específica para atuar no âmbito de reações consorciadas e integralmente regida pelo Direito Público[1]. A Lei previu, ainda, a possibilidade de os entes federativos criarem pessoa jurídica pública de Direito Privado sem fins lucrativos regido por um regime público mitigado por regras de Direito Privado, e também integrante da Administração Indireta dos entes instituidores (Salgado V. A., 2014).
Segundo a Lei nº 11.107, de 2005, regulamentada pelo Decreto n. 6.017, de 2007, para se consorciarem, os entes federativos devem firmar entre si um “contrato de consórcio”, que fixa os objetivos da ação cooperada; a área em que vão atuar em conjunto; as responsabilidades de cada um e as principais condições para a atuação conjunta. Esse contrato de consórcio deve prever, obrigatoriamente, a criação de uma entidade pública pelos entes consorciados, que será responsável por efetivar os compromissos mútuos assumidos no contrato, estabelecendo o seu estatuto jurídico e as regras específicas que deverão reger o seu funcionamento, assim como a sua supervisão pelas administrações diretas de cada ente. O contrato de consórcio deve ser sancionado por Lei de cada um dos entes participantes. Antes de ser sancionado o contrato, seus termos constituem apenas um “protocolo de intenções” (Salgado V. A., 2014).
O consórcio público é uma tecnologia jurídico-institucional projetada para viabilizar a ação pública em rede que une e integra entes federativos autônomos na realização de atividades e projetos de interesse comum. Ele pode facilitar o planejamento local e regional em saúde; viabilizar o investimento financeiro integrado e contribuir para a superação de desafios locais no processo de implementação do SUS.
A instituição de um consórcio público pode favorecer o planejamento intergovernamental; permitir a articulação das políticas públicas entre os entes federativos; minimizar a fragmentação e racionalizar os investimentos realizados pela União, Administração Direta e Indireta, especialmente na implementação de projetos e atividades onde é impossível soluções estritamente municipais, como é o caso da saúde. Para o município de pequeno porte, representa a possibilidade de oferecer à sua população serviços públicos de maior amplitude e qualidade, contornando eventuais insuficiências de capacidade operacional das suas estruturas administrativas. Na área das políticas públicas de saúde, por exemplo, a implantação e a operacionalização de serviços de saúde que contemplem integralmente as demandas de uma população representam, para a maioria dos municípios, encargos superiores à sua capacidade financeira. Nesses casos, a prestação de serviços pelos consórcios pode evitar a sobrecarga do município na manutenção de suas unidades administrativas, na aquisição de equipamentos de custos elevados e na contratação de recursos humanos especializados. O consórcio pode negociar melhores preços, investir em equipamentos que só existem em grandes centros e otimizar equipamentos inoperantes no interior por escassez de profissionais; o que pode representar economia de recursos.
No Brasil, após a promulgação da Lei nº. 11.107, de 2005 proliferaram os consórcios intermunicipais, especialmente nas áreas da saúde, saneamento básico e resíduos sólidos.
Relativamente à participação da União em consórcios públicos, até hoje, há só um registro: a Autoridade Pública Olímpica (APO), instituída Governo Federal, em consórcio com os Governos do Estado e do Município do Rio de Janeiro, com a finalidade de planejar, coordenar, implementar e avaliar a ação dos governos federal, estadual e municipal para a viabilização dos serviços públicos e da infraestrutura necessários à organização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016, que serão realizados na cidade do Rio de Janeiro (RJ). A associação pública foi instituída, nos termos da Lei nº. 11.107, de 6 de abril de 2005, e ratificada pela Lei Federal n. 12.396, de 21 de março de 2011; pela Lei Estadual/RJ n. 5.949, de 13 de abril de 2011 e pela Lei Municipal/RJ nº.5.260, de 13 de abril de 2011, que subscreverem o contrato de consórcio celebrado entre três entes federados (Salgado V. A., 2012).
Findos os jogos, a APO foi transformada na Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO), pela Lei nº. 13.474, de 23 de agosto de 2017, com a finalidade de gerir os legados dos Jogos Olímpicos.
[1] O art. 16 da Lei nº 11.107, de 2005, alterou o inciso IV do art. 41 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, para incluir a associação pública dentre o rol de pessoas jurídicas de direito interno.